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56o OsteRio

Osteria dell’Angolo

Com a Secretária Municipal de Educação Claudia Costin e Simon Schwartzman, pesquisador no IETS, sociólogo e cientista político, especializado em assuntos de educação.
Foi lembrado durante esse encontro que a vereadora Andrea Gouvêa Vieira sugeriu à Secretária Costin que o Clube Umuarama na Rocinha se tornasse uma escola, homenageando André Urani. A Secretária acatou a sugestão, inaugurando a escola em 11 de fevereiro passado, que era o aniversário do André. A Escola Municipal André Urani é um Ginásio Experimental, um de 19 na cidade que funcionam como centros irradiadores de inovação. As aulas acontecem em tempo integral com professores polivalentes e tutores para os alunos.

A apresentação da Secretária foi ao mesmo tempo triste e alentadora.

Seu companheiro de mesa Simon Schwartzman, fez um resumo do contexto desafiador em que a secretaria está trabalhando (a seguir), mas aqui vale a pena destacar um comentário que ele fez em seu blog no dia seguinte: "a educação se despolitiza, existem indicadores de qualidade que são acompanhados [...]".

É chocante pensar que isso seja novidade, porém tem mais. O Rio de Janeiro possui a maior rede municipal do Brasil, servindo 541 mil alunos-e no quesito educação se assemelha aos municípios dos estados mais pobres do país, Simon disse. O município também abriga 269 mil alunos de escolas privadas. Se o sistema público fosse melhor, muitos desses também fariam parte da responsabilidade da secretaria.

Além disso, 255 mil alunos da capital estão no ensino médio (a partir dos quinze anos) dos quais 193 mil na rede estadual, que não é responsabilidade da Claudia. O estado começou uma reforma educacional no ano passado, e estado e município se aproximam, tentando uma integração de trabalho. Mas o estado cobre um território bem maior.
Quantos alunos terminam?

Apenas 65% ficam na escola até os 16 anos; devia ser 100%. Aos 19 anos, apenas 54% por cento ainda está na escola. Por volta dos treze ou quatorze anos, as perdas se acentuam.

"Não se pode esperar que se resolva isso em três anos," comentou Simon.

E o desempenho?

O movimento Todos pela Educação, que estabelece um mínimo satisfatório, utiliza os dados da Prova Brasil.

No 5º ano (antiga 4ª série), somente 35% tem desempenho satisfatório em português, e 30% em matemática. Mais adiante, a situação se torna mais grave. Na 8a série, 25% tem desempenho satisfatório em português, e 11% em matemática. No fim do ensino médio, os números caem para 18% em português e 5% em matemática.

Simon identifica cinco áreas preocupantes:

  • As condições sociais/familiares problemáticas. As Escolas do Amanhã tentam atacar isso.
  • O destino dos alunos que caem para trás, os estudantes analfabetos.
  • A educação profissional. Mesmo sendo que os países industrializados estejam descartando as escolas técnicas como caminho quase certo para alunos de famílias pobres, o Brasil precisa oferecer alternativas ao Ensino Médio. Mas isso não está na alçada da secretaria municipal.
  • O currículo, que foca atualmente em linguagem e matemática. O do ensino médio, "cheio de penduricalhos", precisa ser revisto.
  • A formação e o desempenho dos professores.

Claudia assinalou que os dados de desempenho escolar são do final de 2009. "Os resultados vêm somente depois de muitos anos de empenho," ela afirmou, notando também que pesquisas mostram que 68% do desempenho não dependem da escola, mas da família. Não é o caso de comemorar, mesmo quando desempenho melhora, ela disse, pois a base é muito fraca.

Currículo claro

Claudia trabalha em várias frentes. Uma é ter um currículo "muito claro, preciso, e único". O do sistema municipal data de 1996, e agora foi organizado por bimestres e colocado na Internet, para que os pais pudessem conhecê-lo. A elaboração do currículo tem sido uma prioridade, acima da questão do uso de tecnologia nas escolas.
Além disso, criaram-se sistemas de currículo estruturados, com apostilas para professores e alunos. Os sistemas-em parte, a Educopédia, de aulas digitais-são feitos de forma colaborativa pelos professores. Não se usa livro didático. O método também serve para capacitar os professores e fazer com que se engajem.

O maior desafio, disse a secretária, é justamente "ganhar os professores para a causa". Com 31.925 seguidores, Claudia gasta três horas de seu dia falando no Twitter, na maior parte do tempo conversando, sendo cobrada e debatendo com professores. Há também o site Rio Educa, um portal de trocas pedagógicas no âmbito da Secretaria. Duas vezes por semana, a Secretária visita escolas.

Foco na alfabetização e monitoramento

Antes, adiava-se frequentemente a alfabetização. Agora, acontece no primeiro ano, depois de uma avaliação de prontidão. "Se não, cresce o apartheid," disse a Claudia.
A secretaria mantém a progressão continuada, pela qual até o terceiro ano a criança não repete de ano. O 3º ano portanto é um gargalo. Faz-se uma avaliação no fim do primeiro ano; no ano passado, 83% saíram alfabetizados do 1º ano. Constatou-se, porém, que os professores do segundo e terceiro anos não agregam muito valor. Por isso, o currículo agora até o quarto ano é de apenas português e matemática, com outras matérias, como a ciência, entrando de forma transversal.

Após o terceiro ano, provas bimestrais testam essas duas matérias, mais a ciência e uma redação sobre "O livro que eu mais gostei"-o que suscita uma corrida para a sala de leitura. Na mão do diretor, as provas são uma ferramenta de gestão. Além delas, existem avaliações externas como a Prova Brasil e a Prova Rio. As provas mostram algum progresso, mas sobre uma base muito fraca. Na alfabetização infantil, disse a Secretária, houve "avanços importantes". Os resultados de prova também são utilizados para fazer comparações aluno/aluno, e não somente escola/escola. Assim, tenta-se ajudar os piores alunos, que às vezes necessitam exames oftalmológicos ou de audição.
E os professores ganham livros, pois muitos deles não têm o hábito de leitura.

Capacitação e meritocracia

Há 36 mil professores em sala de aula nas escolas municipais.

A secretaria instituiu uma semana de capacitação curricular (inclusive de reforço escolar), antes do começo das aulas, para os professores. Também 1.100 professores já foram capacitados em realfabetização. Espera-se concluir um esforço de aceleração de alunos defasados até o fim de 2012.

Existem metas, e os professores ganham bônus de salário e viagens (Nova York e São Paulo) no caso de desempenho com melhoras face às metas.

Em reposta a uma pergunta de José Luiz Alqueres sobre gestão das escolas, Claudia explicou que no Rio de Janeiro os diretores são eleitos. Em 2010, ela instituiu um curso preparatório à distância e o requesito de elaboração e defesa diante de uma banca, de um projeto para melhorar uma escola.

Em resposta a uma pergunta de Wallim Vasconcelos, Claudia afirmou que é melhor para o aluno que o professor seja um modelo de cidadania, do que tentar ensinar conceitos e comportamentos em aula. Um grupo de professores recentemente destacadas em matéria do jornal O Globo é exemplar nesse sentido.

O futuro: horário integral

As 151 Escolas do Amanhã já estão em horário integral.

Até 2020, toda a rede municipal deve estar em horário integral, para cumprir uma nova norma federal. O horário integral não inclui reforço escolar, esportes, etc.

O custo disso, se fosse para o ano que vem, seria de R$ 8 bilhões. Os maiores gastos serão em professores e a construção de escolas. Mas é preciso levar em conta a transição demográfica, pela qual o número de alunos está caindo.

O orçamento atual total é de quase R$ 4 bilhões.

Gastos em educação

Por quase oito anos, a questão orçamentária tem sido uma preocupação da vereadora Andrea Gouvêa Vieira. Na hora do debate, ela explicou que a constituição de 1988 requer que os municípios gastem 25% de seus orçamentos na sala de aula. Isso não tem acontecido. A prefeitura, diz ela, "faz manobras contábeis", utilizando os recursos para outros fins, e, a partir de 1998, utilizando recursos do FUNDEF para "mascarar" as manobras.

"São sete bilhões que não foram gastos nos últimos dez anos," disse a vereadora. "Se tivéssemos gasto os 25% da educação desde 98, talvez a gente pudesse agora, com planejamento, o que nunca houve, estar com toda a nossa rede em tempo integral". O Tribunal de Justiça do Estado já determinou que o município recoloque R$ 2,3 bi referentes a 1999-2003.

Comentando que adoraria ter um orçamento maior, a Secretária lembrou que o mais importante é como se gasta. Em alguns estados, relatou, um grande orçamento para a educação atrai o interesse de políticos que até chegam a se revezar no manejo dos recursos, numa espécie de acordo perverso.

Na pauta

O que não tem sido prioridade, a Secretária disse em resposta a uma pergunta de Edson Pinto, são alunos com distúrbios de aprendizagem. No caso de necessidades especiais, houve um investimento na capacitação dos professores. Hoje 60% dos alunos com necessidades especiais estão em classes regulares e 40% em classes ou escolas especiais. Há um total de dez mil alunos na rede com deficiências.

Carla, do Instituto Trevo, perguntou sobre as estratégias da Secretária para dar continuidade ao seu trabalho. "A melhor garantia de continuidade é um bom trabalho," ela respondeu.

Houve apenas uma pergunta que ficou sem resposta, apesar de Claudia e Simon concordarem plenamente com a constatação nela embutida. "Porque no Brasil, há séculos, não se deu nenhuma importância à educação?" perguntou Marcílio Marques Moreira, ex-ministro da Fazenda.

"Pelo menos agora todo mundo entende que a educação é importante," finalizou Simon. "Agora só falta ver o que fazer com ela."

Outros links para matérias do Globo sobre escolas municipais:
http://oglobo.globo.com/integra.asp?txtUrl=/educacao/aula-de-alfabetizacao-de-competencia-4520782
http://oglobo.globo.com/integra.asp?txtUrl=/educacao/texto-criado-pelo-aluno-cd-para-acalmar-4520668
http://oglobo.globo.com/integra.asp?txtUrl=/educacao/campea-de-conteudo-afeto-4520690
http://oglobo.globo.com/integra.asp?txtUrl=/educacao/alfabetizacao-com-clarice-lispector-4520754